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O Ministério Público como fiscal da elaboração do plano municipal pela primeira infância

Inserido em 16 de setembro de 2019
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Síntese dogmática:

No dia 08 de março de 2016 foi publicada a Lei nº 13.257, conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, que veio tratar especificamente sobre a primeira infância, período da vida que abrange os primeiros seis anos completos ou 72 (setenta e dois) meses da criança, dispondo sobre as políticas públicas para essa faixa etária e trazendo alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Código de Processo Penal, na CLT e nas Leis Federais nº 11.770/08 e nº 12.662/12.

O Marco Legal da Primeira Infância dispôs expressamente ser dever do Estado estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância, de forma a assegurar os direitos das crianças com prioridade absoluta. A lei impôs ao gestor público a obrigação de elaborar um plano municipal que contemple uma abordagem multi e intersetorial no atendimento dos direitos da criança na primeira infância e o membro do Ministério Público estadual, como fiscal da lei, tem o dever de exigir dos municípios de suas respectivas áreas de atribuição que elaborem seus planos pela primeira infância.

Fundamentação:

Em março de 2016 foi publicada a Lei Federal nº 13.257, conhecida como Marco Legal da Primeira Infância, que dispõe sobre as políticas públicas de primeira infância, além de ter trazido importantes alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Código de Processo Penal, na CLT e nas leis federais nº 11.770/ 08 e nº 12.662/12.

O Marco Legal da Primeira Infância representou um avanço enorme na legislação brasileira, na medida em que se trata de lei formulada com base em estudos e achados neurocientíficos sobre o desenvolvimento humano. Nesse sentido, cabe destacar logo o primeiro artigo da referida lei ao dispor que “Esta lei estabelece princípios e diretrizes para a formulação e a implementação de políticas públicas para a primeira infância em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano (…) Grifo nosso”[1].

A faixa etária abrangida por essa lei vai do zero aos seis anos de vida, ou os primeiros 72 meses de idade[2], denominada pelos cientistas e abraçada pelo legislador como primeira infância. Essa fase é marcada por vários processos de desenvolvimento, que são influenciados pelo meio ambiente no qual a criança está inserida, pelos estímulos que recebe e pela qualidade dos vínculos afetivos que vivencia. Justamente por isso, o começo da vida deve receber proteção especial da família, do Estado e da sociedade[3].

Ainda no Marco Legal o legislador estabeleceu que a regra da prioridade absoluta prevista no art. 227 da Constituição Federal implica o dever do Estado (aí leia-se Estado no sentido mais amplo da palavra) de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância que atendam às especificidades dessa faixa etária, visando a garantir o seu desenvolvimento integral[4].

Vejam que o legislador usou a expressão “dever do Estado” em estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância, não deixando margem para qualquer interpretação que desobrigue o Estado ou lhe permita a faculdade de adotar tais medidas em favor das crianças que se encontrem dentro dessa faixa etária de vida.

Outrossim, encontramos a favor dos direitos das crianças, adolescentes e jovens a única prioridade que foi considerada absoluta pelo poder constituinte originário de 1988 e a obrigação do Estado de adotar medidas concretas para assegurar os direitos daqueles, em especial os que se encontram na primeira infância, conforme determinado no Marco Legal da Primeira Infância.

Dentre essas medidas que cabe ao Estado encontramos, dentro das atribuições do Poder Executivo Municipal, a elaboração do Plano Municipal pela Primeira Infância.

O próprio Marco Legal estabelece que a União oferecerá assistência técnica na elaboração de planos estaduais, distritais e municipais para a primeira infância que articulem diferentes setores[5].  Por outro lado,  dispõe a lei que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir, nos respectivos âmbitos, comitê intersetorial de políticas públicas para a primeira infância com a finalidade de assegurar a articulação das ações voltadas à proteção e à promoção dos direitos da criança, garantida a participação social por meio dos conselhos de direitos[6].

A referência a uma articulação intersetorial decorre da importância de uma abordagem que articule as diversas políticas setoriais a partir de uma visão abrangente de todos os direitos da criança na primeira infância[7].

Quando faz referência à intersetorialidade por várias vezes, o Marco Legal traz importante inovação na legislação nacional, reconhecendo a importância de se promover um cuidado integral e integrado da criança. E o objetivo central do PMPI, que é um plano de Estado, é justamente articular diferentes setores da administração municipal com o objetivo de estabelecer metas e complementar suas ações, para cumprir o dever do Estado de assegurar a prioridade absoluta dos direitos das crianças[8].

O Plano Municipal pela Primeira Infância constitui um instrumento político e técnico, que deve ser elaborado por um processo democrático e participativo, com colaboração das diferentes secretarias e órgãos públicos da administração pública municipal, poder legislativo, Poder Judiciário, Ministério Público e sociedade civil e que contemple a escuta e participação das crianças, sujeitos de direitos a quem realmente se destina o PMPI[9].

Quanto à escuta das crianças para elaboração do Plano Municipal, cabe abrir um parêntese para ressaltar que o MLPI, mais uma vez, trouxe importante inovação ao prever a participação das mesmas na definição das ações que lhes digam respeito, com o objetivo de promover sua inclusão social como cidadã, devendo ocorrer de acordo com a especificidade de sua idade, através da escuta adequada por profissionais qualificados[10].

Além do processo democrático e participativo de diversos setores da sociedade, incluindo as crianças, os planos devem se constituir de um diagnóstico da situação de vida, desenvolvimento e aprendizagem das crianças no município, uma lista de ações das diferentes secretarias para garantir que os direitos das crianças sejam integralmente atendidos e metas que permitam avaliar as políticas planejadas e em curso[11].

Portanto, o Plano Municipal pela Primeira Infância constitui um importante instrumento de promoção dos direitos das crianças na primeira infância e talvez seja o único instrumento previsto em lei que promova uma abordagem intersetorial das crianças nos primeiros anos de vida.

A questão que se coloca é quando o município se mantém inerte e não elabora seu respectivo plano pela primeira infância. Nesta situação, o que cabe ao membro do Ministério Público estadual fazer?

Inicialmente, cabe enfrentar a questão da obrigatoriedade ou não da elaboração de um plano municipal pela primeira infância pelos municípios brasileiros.

Ao analisar a redação do art. 3º do Marco Legal da Primeira Infância, verifica-se que o legislador foi enfático ao dispor que a prioridade absoluta em assegurar os direitos da criança, do adolescente e do jovem implica o dever do Estado de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância que atendam às especificidades dessa faixa etária. Note-se que a palavra utilizada foi dever do Estado, não havendo espaço para interpretações que entendam que exista uma faculdade para o gestor público.

Dessa forma, há uma imposição legal ao Estado de estabelecer, dentre outras medidas, planos para a primeira infância, visando a garantir o desenvolvimento integral das crianças dentro dessa faixa etária.

Entendo, dentro dessa lógica, que os municípios têm o dever de elaborar seus planos municipais pela primeira infância, de forma a assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos mencionados no art. 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente[12].

Esse raciocínio se confirma quando lemos a redação do artigo 7º do Marco Legal, ao dispor que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir comitê intersetorial de políticas públicas para a primeira infância com a finalidade de assegurar a articulação das ações voltadas à proteção e à promoção dos direitos da criança, dando ao gestor público a possibilidade e não o dever de adotar tal medida.

De forma a incentivar a adoção de uma abordagem intersetorial no atendimento dos direitos da criança na primeira infância, estabeleceu o legislador que a União deverá buscar a adesão desse tipo de abordagem pelos Estados, Distrito Federal e Municípios e, ainda, oferecerá assistência técnica na elaboração de planos estaduais, distrital e municipais para a primeira infância que promovam essa articulação entre os diversos setores da sociedade[13].

Percebe-se, portanto, que, dentro do Marco Legal, a previsão de incentivo e prestação de assistência técnica por parte da União aos Estados, Distrito Federal e Municipal diz respeito apenas à instituição de um comitê intersetorial de políticas públicas para a primeira infância, ao contrário do estabelecimento de políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância, em que o legislador impôs um dever (art. 3º).

Assim, não me restam dúvidas de que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios têm a obrigação legal de estabelecer seus respectivos planos municipais pela primeira infância, os quais incluirão, necessariamente, políticas, programas e serviços para as crianças dentro daquela faixa etária.

Como membro do Ministério Público estadual que atua especificamente na área de tutela de interesses individuais e coletivos da infância e juventude[14], ater-me-ei à elaboração do plano municipal pela primeira infância.

Pois bem. Partindo do pressuposto de que os municípios brasileiros têm o dever de elaborar seus respectivos planos municipais pela primeira infância, entendo que cabe ao Promotor de Justiça com atribuição para atuar na área da tutela coletiva da infância e juventude fiscalizar se os municípios sob suas atribuições elaboraram seus respectivos planos, podendo cobrar, como defensor dos direitos sociais e individuais indisponíveis[15], caso não o tenham feito, que o façam.

Para o exercício de tal atribuição, a lei previu uma série de instrumentos de que o membro do Ministério Público dispõe, destacando-se a instauração de procedimento administrativo para fiscalização de políticas públicas[16].

Por sua vez, o Conselho Nacional do Ministério Público, com a finalidade de disciplinar a instauração e tramitação da notícia de fato e do procedimento administrativo, dispõe no artigo 8º, II, da Resolução nº 174, de 04 de julho de 2017, que o procedimento administrativo é o instrumento próprio da atividade-fim destinado a acompanhar e fiscalizar, de forma continuada, políticas públicas ou instituições.

Portanto, o primeiro passo que o Promotor de Justiça com atribuição para a área da tutela coletiva da infância pode dar é instaurar um procedimento administrativo com a finalidade de verificar se o município sob sua atribuição possui um plano municipal pela primeira infância ou se está em processo de elaboração de seu plano.

Dependendo da resposta do município, cabe ao Promotor de Justiça adotar uma determinada diligência. Se o município já houver elaborado, submetido à aprovação pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e publicado seu plano municipal pela primeira infância, o membro do Parquet acompanhará a sua implementação, a fim de verificar se as diretrizes gerais para o governo e a sociedade civil  na defesa, promoção e realização dos direitos das crianças de até seis anos de idade estão recebendo a prioridade devida e se estão sendo efetivamente executadas.

Se o município não houver publicado seu plano municipal pela primeira infância, mas já tiver constituído um grupo de trabalho, que deve ser constituído por diversos entes e organizações, para os debates necessários à sua formulação, pode o Promotor de Justiça acompanhar esse processo e até participar das reuniões, eventualmente orientando quanto aos aspectos legais envolvidos.

Mas se nada houver no município de atuação quanto à elaboração do Plano Municipal pela Primeira Infância, entendo que cabe ao Promotor de Justiça com atribuição exigir que ele seja idealizado, construído e elaborado, justamente com base no que dispõe o art. 3º do Marco Legal da Primeira Infância[17].

Foi essa a hipótese que ocorreu no Município no qual tenho atribuição para atuar. Inicialmente, instaurei um procedimento administrativo para acompanhar as políticas, programas, planos e serviços para a primeira infância no referido município e a primeira diligência adotada nos autos do referido procedimento foi expedir ofício ao Poder Executivo Municipal indagando sobre a existência daqueles dentro do município e, como esperava, absolutamente nada havia sido feito com relação à proteção e promoção da primeira infância.

Então, em seguida, expedi novo ofício sugerindo ao Prefeito que analisasse a possibilidade de criar um grupo de trabalho ou um comitê intersetorial de coordenação de políticas publicas pela primeira infância para estudo e criação de um Plano Municipal pela Primeira Infância no município. Tal estratégia trouxe resultados imediatos, uma vez que o Prefeito Municipal determinou imediatamente à Secretaria Municipal de Cultura, Lazer, Igualdade Racial e Direitos Humanos a elaboração do PMPI.

Ocorre que é preciso deixar claro que o Plano Municipal pela Primeira Infância é um plano intersetorial, que deve necessariamente envolver diversos setores do Poder Executivo Municipal, assim como a participação do Poder Legislativo e da sociedade civil.

Com efeito, considerando que constituem áreas prioritárias para as políticas públicas para a primeira infância  a saúde, a alimentação e a nutrição, a educação infantil, a convivência familiar e comunitária, a assistência social à família da criança, a cultura, o brincar e o lazer, o espaço e o meio ambiente, bem como a proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista, a prevenção de acidentes e a adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica[18], a elaboração do Plano Municipal pela Primeira Infância precisa envolver todos os setores do governo responsáveis por essas áreas de atuação, além da participação ativa da sociedade civil no processo.

Assim, não é possível se pensar na elaboração do PMPI, no âmbito do Executivo Municipal, sem a participação efetiva, no mínimo, das secretarias de saúde, educação, assistência social, cultura e lazer, esportes e de urbanismo.

Outro órgão da Administração Pública Municipal que pode desempenhar um papel fundamental na promoção da primeira infância é a Secretaria de Fazenda. Isto porque todos os investimentos que demandarão custos financeiros pelo governo municipal passarão pela referida secretaria e o conhecimento pelo Secretário e pelos demais integrantes da secretaria dos motivos que foram previstas despesas dessa natureza é fundamental para que compreendam as mesmas como investimento público e não como gastos.

Aqui cabe abrir outro parêntese para lembrar que o vencedor do Prêmio Nobel de Economia, James Heckman, conseguiu demonstrar para o mundo que a cada US$ 1,00 investido na primeira infância, há um retorno para a sociedade de US$ 7,00 quando a pessoa atinge a vida adulta. Ainda de acordo com o referido estudo, esse investimento tende a trazer como retorno maior qualidade de vida, melhor colocação no mercado de trabalho, melhores salários e oportunidades profissionais e mais saúde, constatada pelos índices baixos de hipertensão, doenças cardíacas, além da diminuição das chances de envolvimento com bebidas alcoólicas e cigarros antes dos 17 anos.[19]

Portanto, é indiscutível que se trata de investimento público altamente eficaz em termos socioeconômicos, sendo de vital importância que os gestores públicos, assim como a sociedade civil como um todo, entendam a necessidade de se investir prioritariamente na primeira infância.

Por outro lado, como já dito anteriormente, na elaboração do plano municipal pela primeira infância é necessário adotar uma abordagem participativa, incluindo, além dos diversos setores da administração pública municipal, o envolvimento efetivo do Poder Legislativo municipal e da própria sociedade, por meio de suas organizações representativas, dos profissionais especializados, dos pais e das crianças, no aprimoramento da qualidade das ações e na garantia da oferta dos serviços[20].

Veja-se que a previsão da participação das crianças na elaboração de políticas públicas pela primeira infância constitui uma importante inovação na legislação brasileira e que tem por finalidade promover a inclusão social das mesmas como cidadãs[21].

Obviamente, a participação da criança será feita através da escuta especializada por profissionais qualificados e de acordo com a especificidade de sua idade.

Essa previsão legal tem um significado muito importante porque considera a criança como sujeito de direitos no presente, e não apenas um ser em desenvolvimento de um adulto que se tornará no futuro. A criança existe hoje e é para ela e pensando nela que as políticas públicas têm que ser planejadas e executadas.

Da mesma forma, tal previsão de escuta da criança possibilita acabar com a visão exclusivamente adultocêntrica do mundo na formulação de políticas públicas, em que os adultos consideram que sabem o que é melhor para as crianças, de acordo com os seus valores e sua visão de mundo, sem considerar que as crianças são seres humanos em desenvolvimento e não pessoas totalmente imaturas que não possuem condições de ter seus próprios desejos e pontos de vista.

Muito pelo contrário, as crianças possuem vontades próprias e uma visão muito genuína dos fatos, que precisam se considerados pelos profissionais que pensam e formulam ações e políticas públicas que irão atingi-las direta ou indiretamente.

É preciso sempre relembrar que o mundo tem que ser amigável para as crianças. Isto porque elas são seres em processo de desenvolvimento, sendo especialmente sensíveis ao meio ambiente que as cerca e diretamente impactadas pelas experiências vividas.

Assim, uma situação que particularmente me marcou no município em que atuo[22] foi a retirada de um parquinho infantil que havia na praça da prefeitura municipal e localizado exatamente em frente a uma creche municipal. Sempre que passava pelo local, costumava ver muitas crianças da creche municipal aproveitar aquele parquinho após o horário de saída, brincando alegres e divertidos nos brinquedos.

Ocorre que, em um determinado dia, passava pelo local após um dia de trabalho, como de costume, e fui surpreendida pela substituição do parquinho, que havia sido retirado do local, por uma academia. No local, uma faixa bem grande anunciava orgulhosamente a inauguração daqueles aparelhos de ginástica para a população.

Nada tenho contra a instalação de academias públicas de ginástica pelo município, mas o que me incomodou profundamente foi o fato de a Prefeitura ter retirado de um espaço localizado em frente a uma creche municipal um espaço de brincadeiras, em que efetivamente as crianças aproveitavam, como pude presenciar inúmeras vezes.

Esse é um típico exemplo de como os gestores públicos não estão atentos aos interesses das crianças em sua integralidade. O ato de brincar, além de ser fundamental para o desenvolvimento saudável, é um direito expresso no Marco Legal da Primeira Infância[23]. Com efeito, o referido diploma dispôs expressamente que os Municípios (assim como a União, os Estados e o Distrito Federal) deverão organizar e estimular a criação de espaços lúdicos que propiciem o bem-estar, o brincar e o exercício da criatividade em locais públicos e privados onde haja circulação de crianças[24].

A elaboração de um Plano Municipal pela Primeira Infância que seja precedido de um diagnóstico sobre as crianças de zero a seis anos existentes no município, incluindo a quantidade de crianças nessa faixa etária, assim como a situação familiar e comunitária em que se encontram, que adote uma abordagem e uma coordenação intersetorial, que efetivamente articule as diversas políticas setoriais a partir de uma visão abrangente de todos os direitos da criança na primeira infância[25], certamente evitaria esse tipo de decisão governamental.

Esse é apenas um exemplo que para mim foi muito significativo, mas que não esgota as inúmeras situações cotidianas na gestão pública que demonstram a falta de políticas públicas em nosso país que atendam ao interesse superior da criança e à sua condição de sujeito de direitos e de cidadã[26].

Conclusão:

O Marco Legal da Primeira Infância acaba de completar três anos, já tendo saído de sua “primeiríssima infância”, sendo ainda uma lei muito pouco conhecida pelos operadores do direito, assim como pelos gestores públicos e pela sociedade em geral, e que precisa ser colocada em prática com a máxima urgência.

Nesse contexto, o membro do Ministério Público tem grande responsabilidade de levar essa importante lei ao conhecimento da população e de cobrar dos gestores públicos, dos integrantes das Câmaras Municipais e da sociedade civil organizada a sua efetiva implementação, através da previsão, formulação e execução de políticas públicas, planos, programas e serviços governamentais que realmente protejam os interesses das crianças e promovam seus direitos em sua integralidade.

Para tanto, o Promotor de Justiça tem ao seu dispor instrumentos como o procedimento administrativo, o inquérito civil e a ação civil pública, mas o contato direto com o Poder Executivo, o Poder Legislativo e a sociedade civil, através de reuniões e audiências públicas pode ser o grande diferencial na efetiva aplicação do Marco Legal da Primeira Infância.

 

Proposta de Enunciado:

 Plano Municipal pela Primeira Infância. Obrigatoriedade legal prevista no Marco Legal da Primeira Infância. Promotor de Justiça como fiscal e facilitador da sua elaboração.

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Luciana Pereira Grumbach Carvalho

Promotora de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

[1] Art. 1º, Lei nº 13. 257/16 “ Esta Lei estabelece princípios e diretrizes para a formulação e a implementação de políticas públicas para a primeira infância em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano, em consonância com os princípios e diretrizes da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); altera a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); altera os arts. 6o, 185, 304 e 318 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal); acrescenta incisos ao art. 473 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943; altera os arts. 1o, 3o, 4o e 5o da Lei no 11.770, de 9 de setembro de 2008; e acrescenta parágrafos ao art. 5o da Lei no 12.662, de 5 de junho de 2012

[2] Art. 2º, Lei nº 13.257/16 “Para os efeitos desta Lei, considera-se primeira infância o período que abrange os primeiros 6 (seis) anos completos ou 72 (setenta e dois) meses de vida da criança”.

[3] Extraído da Cartilha Primeira Infância é prioridade absoluta. Disponível em http://prioridadeabsoluta.org.br/wp-content/uploads/2017/11/cartilha_primeira-infacc82ncia.pdf, Acesso em 08.10.2018.

[4] At. 4º da referida lei.

[5] Art. 8º, parágrafo único,  MLPI.

[6] Art. 7º, MLPI.

[7] Art. 6º, MLPI.

[8] Extraído do site da Rede Nacional Primeira Infância. http://primeirainfancia.org.br/pmpi/. Acesso em 09/04/2019.

[9] Ibidem.

[10] Art. 4º, II e parágrafo único, MLPI.

[11] Extraído do site da Rede Nacional Primeira Infância. http://primeirainfancia.org.br/pmpi/. Acesso em 09/04/2019.

[12] Art. 4º – É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária.

[13] Art. 8º, parágrafo único, MLPI.

[14] A autora é titular da 1ª Promotoria de Justiça de Infância e Juventude da Comarca de São João de Meriti, município localizado na baixada fluminense, com população estimada pelo IBGE em 471.888 habitantes, possuindo a segunda maior densidade demográfica do Brasil.

[15] Art. 127, CF/88.

[16] Art. 26, I, Lei nº 8.625/93.

[17] Art. 3o  A prioridade absoluta em assegurar os direitos da criança, do adolescente e do jovem, nos termos do art. 227 da Constituição Federal e do art. 4o da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, implica o dever do Estado de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira infância que atendam às especificidades dessa faixa etária, visando a garantir seu desenvolvimento integral.

[18] Art. 5º, Lei nº 13.257/16.

[19] Investir no desenvolvimento na primeira infância: Reduzir déficits, fortalecer a economia. Disponível em: https://heckmanequation.org/assets/2017/01/D_Heckman_FMCSV_ReduceDeficit_012215.pdf. Acesso em 08.10.2018.

[20] Art. 4º, VI, Lei nº 13.257/16.

[21] Art. 4º, parágrafo único, Lei nº 13.257/16.

[22] São João de Meriti, município localizado na Baixada Fluminense.

[23] Art. 5º, MLPI: Constituem áreas prioritárias para as políticas públicas para a primeira infância a saúde, a alimentação e a nutrição, a educação infantil, a convivência familiar e comunitária, a assistência social à família da criança, a cultura, o brincar e o lazer, o espaço e o meio ambiente, bem como a proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista, a prevenção de acidentes e a adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica. Grifei.

[24] Art. 17, Ibidem.

[25] Art. 5º, Ibidem.

[26] Art. 4º, I, MLPI.