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Dicas Cinematográficas de Patrícia Carvão

Inserido em 21 de junho de 2024
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A procuradora de Justiça Patrícia Carvão escreve quinzenalmente na newsletter da Amperj. O tema de sua coluna são filmes e séries nos cinemas e nas plataformas de streaming.

Acompanhe e aproveite as sugestões sempre qualificadas da cinéfila.

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Cinema Brasileiro

Na quarta-feira, 19 de junho, celebrou-se o Dia do Cinema Brasileiro. Por este motivo, como justa homenagem, trago para nós algumas sugestões nacionais mais recentes.

“Grande Sertão: Veredas” é um romance magistral, uma das obras-primas da literatura brasileira, escrito por João Guimarães Rosa em 1956 e, posteriormente, traduzido em vários idiomas. O livro nos apresenta um relato único, absolutamente original na sua proposta de linguagem, das vivências do jagunço Riobaldo, que vão desde os valores e princípios que estruturam sua personalidade e que o constituem como sujeito, até os sentimentos mais profundos e contraditórios que atravessam sua existência humana. 

Os laços que Riobaldo mantém com o também jagunço Reinaldo (que ora se apresenta ao bando sob o nome de Diadorim) é um dos pontos fortes que permeia a trama, e que a lógica racional do viver faz com que Riobaldo não compreenda ao certo. A pureza do sentimento que se estabelece entre ambos contrasta com a aridez e a violência do sertão, que serve de cenário à narrativa, o que faz despertar em Riobaldo uma série de questionamentos acerca da lógica do existir e da sobrevivência naquele espaço.  

A adaptação de qualquer obra literária para o cinema é sempre um desafio e esse desafio se torna ainda mais complexo ao se pensar em “Grande Sertão: Veredas”.

A diretora Bia Lessa nos apresenta um ousado e difícil trabalho ao trazer para o cinema o filme “Grande Sertão”, que tem no elenco Caio Blat, Luisa Arraes e Rodrigo Lombardi, dentre outros atores.

O sertão da obra literária se transforma em uma comunidade distópica, dominada por facções rivais (semelhante às comunidades em confronto da cidade do Rio de Janeiro), cercada por uma grande muralha que repete, na mesma medida, o ambiente árido e violento do sertão retratado por Guimarães Rosa. 

As disputas pelo poder e pela sobrevivência entre Joca Ramiro, Hermógenes e Zé Bebelo, com seus respectivos bandos de jagunços, é transposta para um cenário atual de confronto, conhecido por todos nós.

A narrativa prende a atenção, tem ritmo eletrizante e preserva, em alguma medida, a insuperável grandeza da obra literária, ao não deixar de lado as angústias e inquietações de Riobaldo (interpretado por Caio Blat), que aparece, alternado presente e futuro, nos trazendo pela fala de um Riobaldo já mais velho e reflexivo, algumas das frases mais emblemáticas da obra original, a saber, “ Viver é muito perigoso” ou ainda “ Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura”. (Em cartaz nos cinemas).

Aliás, se você gosta da obra de Guimarães Rosa, a Netflix trouxe esta semana para o seu catálogo o filme “Mutum”, de 2007, dirigido por Sandra Kogut, baseado na novela “Campo Geral”. O filme é sensível, melancólico e nos apresenta a dureza da infância vivida pelo menino Thiago e sua família, em meio à pobreza e à falta de acesso a direitos fundamentais básicos no lugar conhecido como Mutum, no sertão de Minas Gerais.

Thiago é um menino de 10 anos, doce e calado, que precisará lidar com a violência do pai e com as dores e questionamentos do mundo dos adultos, sem entender ao certo como processar tudo o que lhe acontece.

Outro filme que recomendo muito é “Marte Um”. É um filme lindo. O elenco é todo formado por atores negros, com desempenhos de tirar o fôlego. Filmado em Contagem (MG), o filme traz tantas reflexões… Ressaltaria alguns aspectos que me inspiraram.

O filme fala sobre ser gente, com todas nossas falhas,  defeitos e peculiaridades, que constroem nossa singularidade; sobre o que significa ser pai/mãe de alguém, e todos os desafios que isso representa, toda a desconstrução que é preciso fazer a cada dia para dar conta dessa tarefa (filhos não podem representar nossos projetos de sonho; não temos o menor controle sobre isso). 

Sobre cuidado com a saúde mental para não enlouquecer com a rotina insana; sobre a importância do afeto, apesar de toda a adversidade que seja possível encontrar pela frente. Acima de tudo sobre sonhar, sobre ter esperança e acreditar. O filme é imperdível. (Disponível no Globoplay,  no NOW (NET/Claro), na AppleTV  e no Google Play).

Termino aqui falando sobre “Uma Família Feliz”, que esteve em cartaz recentemente nos cinemas, obra baseada no romance escrito por Raphael Montes (criador da série original “Bom dia, Verônica”, na Netflix), agora já disponível no streaming. O filme tem um roteiro de suspense muito diferente, que prende a atenção, com um desfecho original e inquietante. A narrativa nos traz a rotina de uma família quase perfeita, que esconde um mistério a ser decifrado quando as crianças começam a aparecer machucadas. Disponível no Now (NET/Claro), AppleTV e Google Play.

Haveria ainda muitos, muitos outros filmes que caberiam aqui, mas que o espaço não permite discorrer (“Central do Brasil”, “Cidade de Deus”, “Como Nossos Pais”, “Benzinho”, “A Vida Invisível”, “Pedágio”, “Que horas Ela Volta”, “O Som Ao Redor”, “Bacurau”…). Aproveite para colocar em dia sua lista de produções nacionais. A maioria delas está nos canais de streaming.  

Bom final de semana!