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‘Independência funcional é cláusula pétrea’

Candidato único, Manoel Murrieta será reeleito em novembro para mais dois anos à frente da Conamp

Inserido em 12 de novembro de 2021
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Por Raphael Gomide, Roberta Pennafort e Natália Trotte

Os últimos meses têm sido intensos para o presidente da Conamp, Manoel Murrieta. O ano de 2021 tem apresentado uma série de desafios ao Ministério Público e à sua independência, boa parte vindos do Legislativo, como a PEC 05, a Lei de Improbidade Administrativa, o Novo CPP e o Novo Código Eleitoral. A poucos dias de ser reeleito para comandar a entidade nacional, como candidato único, Murrieta deu entrevista para a Revista da Amperj. Ele destaca como a união do MP brasileiro foi fundamental para barrar o substitutivo da PEC 05, diz que Ministério Público e sociedade são uma “simbiose indissociável” e que “independência funcional é cláusula pétrea”.

REVISTA DA AMPERJ: A que o sr. credita os projetos legislativos que afetam o MP?

MANOEL MURRIETA: Este movimento reformista é injusto, falta diálogo e há incompreensão do verdadeiro papel do Ministério Público. A Constituição de 1988 trouxe um perfil combativo à instituição e vivemos hoje uma fase de necessário amadurecimento de relacionamento com as demais instituições. Há uma ideia personificada, e o MP não combate pessoas
e sim fatos, condutas.

RA: Fale sobre o trabalho da Conamp, Amperj e entidades associativas no Congresso e junto à sociedade pela independência do MP em votações como a da PEC 05.

MM: Na pandemia, as entidades de classe se depararam com um desafio gigantesco para atuar à distância, que dificultou sobremaneira nosso trabalho, mas nada nos desencorajou ou impediu de lutar. Desenvolvemos novas abordagens, já que até agora não podemos contar com o debate corpo a corpo, com os atos públicos. Nos reinventamos e mesmo diante de tantas frentes de enfraquecimento estamos conseguindo grandes conquistas de resistência e melhorias, apesar de alguns prejuízos. Há de se exaltar a votação do substitutivo da PEC 05/21, pois a união foi a principal ferramenta, além da capacidade de mobilizar a sociedade civil diante de um grave risco para a população. Fomos a principal pauta nos maiores meios de comunicação.

RA: Qual foi a importância da mobilização e dos atos da Conamp e das associações do Brasil de repúdio para a rejeição do substitutivo da PEC 05?

MM: O substitutivo da PEC 05 foi o ponto alto da comprovação de que união do MP brasileiro e o engajamento e a mobilização da sociedade são armas que sob qualquer roupagem geram resultados positivos. A Amperj e demais afiliadas foram brilhantes junto aos parlamentares e no esclarecimento à sociedade. Esperamos não sofrer ataques tão duros novamente.

RA: Quais as consequências, para a sociedade, de eventual enfraquecimento do MP?

MM: Ministério Público forte, sociedade protegida. Na via inversa, a sociedade perderá a sua última trincheira, que é o Ministério Público, instituição responsável pelo combate à
criminalidade grave, ao crime organizado, ao tráfico de drogas, ao tráfico de humanos; responsável pela defesa da infância, dos idosos, do patrimônio público, do consumidor, do
meio ambiente. Não há como cumprir sua missão constitucional sem autonomia e independência.

RA:A sociedade reconhece a atuação da instituição e a defende?

MM: Nossa legitimação deriva da voz da sociedade. A sociedade tem aumentado o tom de voz a nosso favor, mas em meio à pandemia houve desmobilização em temas vitais. Entretanto na
hora certa a sociedade sempre se levanta e clama por respeito a seus direitos. Não há como se pensar em Ministério Público sem a sociedade, um depende de outro, é uma simbiose indissociável.

RA: O Código de Ética do Ministério Público é uma sinalização de que é possível aperfeiçoar a instituição sem interferência externa?

MM: Não há a menor dúvida. Estamos dispostos a revisões, reformulações, remodelações, mas sob a linha de aperfeiçoamento no aspecto de melhor servir a sociedade. Não aceitamos retrocesso nas ferramentas para a satisfação da missão constitucional.

RA: Como as entidades de classe e os membros do MP podem atuar de modo a reafirmar no dia a dia a independência funcional?

MM: A independência funcional é clausula pétrea, dogma que não admite questionamentos, é a base de toda eficiência de nossa atuação. A exaltação a ela é dever de todo membro do Ministério Público brasileiro, seja no dia a dia da sua atuação, seja nas suas manifestações públicas. Noticiar e bradar contra o desrespeito a ela é um dever cívico.

RA: Que balanço faz da Operação Lava Jato? Como suas repercussões afetam o MP hoje e que lições trouxe para o aperfeiçoamento institucional?

MM: A Lava Jato é um marco divisor da história do país. Sua importância para o combate à corrupção e a defesa do patrimônio público é inquestionável. Portanto deve ser respeitada e festejada. Por outro lado, foi uma página escrita sem precedentes anteriores, de vanguarda e, como todo trabalho novo, traz ensinamentos para o futuro.

RA: A democracia e as instituições têm sofrido ataques no país. Qual é o papel do MP em frear retrocessos e na luta pela defesa do regime democrático? A democracia está em risco no Brasil?

MM: O Ministério Público é o defensor do regime democrático. Todos os membros, ao ingressarem na carreira, fizeram um juramento de defender a democracia. Ao menor ataque à democracia, devemos e nos levantaremos em sua defesa. Ainda há promotores de Justiça no Brasil. Vejo com muita segurança e tranquilidade a força das instituições para garantir o Estado Democrático de Direito no Brasil.

RA: Qual é o papel do MP nas eleições de 2022, diante de ataques ao sistema de voto eletrônico e das fake news?

MM: Somos os grandes fiscais da legalidade do processo eleitoral. Não podemos permitir qualquer eiva de ilegalidade ou suspeita nas eleições. Acredito na Justiça Eleitoral e no
compromisso dos membros do Ministério Público Eleitoral para coibir com firmeza qualquer ameaça ao equilíbrio entre os candidatos ou a lisura do pleito.